Por Cesar Kuzma - teólogo
Amig@s!
Celebramos
hoje a festa de Corpus Christi, a festa do Corpo do Senhor e a festa do Pão da
vida. Penso, por bem, que isso nos traz uma grande questão, atenta, provocativa
e, também, responsável.
Bem,
o que isso nos diz?... O que é celebrar a festa do Corpo do Senhor?...
Ora,
seria muito simples dizer que a Eucaristia é a presença real de Cristo. Isso é
questão de fé, ponto. Mas não é este o cerne da questão. Afirmar na fé que a
Eucaristia que celebramos é o Corpo do Senhor é ir muito mais longe, é
lançar-se no mistério que invade a nossa história e o nosso tempo, quando
professamos que Deus esvaziou-se de si mesmo para nos atingir (Fl 2,6-9),
desceu e veio ao nosso encontro, assumiu a nossa vida e o nosso destino, viveu
a nossa esperança e fez dela a sua, sentiu as nossas dores e as nossas
lágrimas, foi fiel em sua missão de Reino e deu a sua vida a esta causa. É a
causa da vida e não da morte. É a causa do caminho da justiça e do amor, e não a
da condenação. É o caminho do Reino, que por fidelidade assume a todas as
consequências, dando “corpo” a uma vontade que parte de Deus e nos atinge,
levando-nos do tempo à plenitude (Ef 1,10). Celebrar a festa do Corpo do Senhor
é entender a vida que percorreu A Pessoa que é este corpo e o que isso implica
em nós. Mais. É seguir o caminho que este Cristo seguiu, sendo fiel a Deus na
prática da justiça, do amor e da paz. Com certeza, é fazer memória. É
referendar o Memorial do Senhor!
Mas,
o que é celebrar a festa do Pão da Vida?...
Bom,
o próprio nome já diz: “Pão da Vida”. São palavras do próprio Jesus: “Eu vim
para que todos tenha vida” (Jo 10,10). Assume-se aqui a condição do Reino e a prática
de vida do próprio Jesus que em seu viver levou vida aos que não tinham e
esperança aos que estavam na desesperança. É a vida que nos preenche do
verdadeiro sentido, que faz com que os cegos possam ver, que faz a outros andar
e aos mudos falar. É a vida que anunciamos e que é a essência da “Boa Nova”
inaugurada por Jesus. É a vida que se faz pão e que como pão vem saciar aqueles
e aquelas que têm fome. Fome de pão e de justiça. É a vida que se faz pão e que
como pão chama a “todos” - a todos - para a se assentarem ao redor da mesa,
quando Ele está presente e ceia com eles, quando Ele reparte o pão e se faz
conhecer pelo gesto de partilha. Ah, a partilha, prática tão esquecida e tão
importante para entender o sentido daquilo que celebramos... É o pão da vida
que se multiplica e vai ao encontro de todos, para que ninguém se perca, mas
que se saciem e se envolvam com a fonte da verdadeira vida.
Mas em
que estas duas questões nos tornam apreensivos e nos chamam a
responsabilidade?...
Vejamos...
É no compromisso com Aquele que se faz perceber pela fração deste pão. Comungar
o pão é comungar o Cristo e comungar o Cristo é fazer comunhão com a proposta
de vida e de Reino inaugurada por este Cristo, por este homem de Nazaré, que
nos chama ao seguimento e ao enfrentamento da vida. Celebrar a festa do Corpo
do Senhor e a festa do Pão da Vida é lançar-se a Ele da forma como Ele se
lançou a nós. É entregar-se a causa do Reino e assumir a esperança deste, do
mesmo modo como Ele se entregou a nossa causa e assumiu a nossa esperança. É
viver como Ele viveu e sentir o que ele sentiu...
Contudo,
é importante ater-se em algo! A corporeidade do Cristo tem que acontecer de
fato, e ela não pode limitar-se apenas a um discurso de fé. Se assim for, será
fraca e vazia de conteúdo. A corporeidade de Cristo deve acontecer da forma
como ele fez e agiu. A Palavra de Deus se fez carne, ela se fez ver e tocar
(1Jo 1,1-2), ela se fez força e presença, fonte de vida e de esperança. Esta
corporeidade deve ser vivida no dia de hoje, no contato e no abraço, nos gestos
de fé e de carinho, na solidariedade. Deve-se fazer sentir este corpo nos
muitos corpos que passam pelo nosso caminho e que não nos damos conta de sua
existência. Ignoramos. Triste realidade. A corporeidade deste Cristo deve se
fazer sentir no corpo dos pobres, daqueles que são excluídos e banidos de nossa
sociedade e de nossas Igrejas e movimentos. A corporeidade deste Cristo deve se
fazer sentir nas inúmeras mulheres que sofrem em nossa sociedade, nos menores e
nos mais vulneráveis. A corporeidade deste Cristo deve se fazer valer pelo
autêntico testemunho da vida e do serviço. Ali este Corpo do Senhor será
verdadeiramente o Pão da Vida. Ali este Corpo fará viver o que já perdeu força
e se tornou pequeno, tornando-o cheio de vida, ressuscitado para o Novo que
vem!
Diante
dos espetáculos de luzes e sons que invadem a nossa prática de fé, ocupando o
espaço numa belíssima e autêntica devoção popular, com “corpos” midiáticos que
ocupam o lugar do verdadeiro Corpo, fazemos por bem relembrar aquele, cujo
Corpo celebramos. Este é o ponto. Há o
outro lado também. Diante de frentes que não se abrem ao novo que avança pela
Igreja e que insistem numa liturgia vazia e antiga, reforçamos aqui o apelo de
Jesus que nos convida a seguir e a “ter parte com ele”, fazendo deste Pão um “arder”
para a nova vida que se inaugura pela prática do Reino.
Assim,
contemplando e atuando na natureza frágil e pecadora que Deus assumiu, fazendo
desta o seu corpo, por um gesto de amor e paixão, assim, somente assim, podemos
ousar dizer: “Eis o Corpo de Cristo”!
Esta
a festa que celebramos - a festa do Corpo do Senhor e do Pão da Vida.